A concentração dos veículos de comunicação sob a propriedade de poucos empresários e empresas em todo o mundo, sem dúvida, é um fator bastante relevante, senão o mais importante, para o papel que os Meios têm desempenhado na política e na economia. Da mesma maneira, as pesquisas e os estudos de análise do conteúdo e do discurso do jornalismo têm demonstrado reincidentemente a relevância do poder da opinião dos veículos de comunicação na formação da opinião e da agenda públicas. Também chamam nossa atenção estudos que, desde o final dos anos 70, demonstram como a neutralidade e a objetividade da mídia são construções discursivas.
Poucos trabalhos, no entanto, têm se dedicado a analisar a empresa de comunicação como lugar de trabalho, lugar de produção de produtos a partir de determinada lógica produtiva e organizativa e como suas características têm se alterado ao longo das últimas décadas em decorrência das novas tecnologias e processos de organização do trabalho. Também não temos notícias de pesquisas que estudem a empresa de comunicação como uma organização social, orientada por determinados processos de construção de sentidos; como instituição social que congrega pessoas, tem cultura e um influente círculo de sociabilidades.
É fato a constatação das profundas mudanças que ocorreram na organização e nas relações de trabalho, mas pouco se tem pesquisado sobre o quanto tais mudanças implicaram em transformações nos produtos culturais veiculados pele mídia e como, em decorrência deles, tem se alterado os perfis profissionais.
Partindo da confirmação das hipóteses constatadas na pesquisa Comunicação e trabalho: a construção dos sentidos do trabalho pelos receptores dos meios de comunicação, realizada entre 2002-2004, no âmbito de grandes empresas da cidade de São Paulo, constata-se que os discursos produzidos pelos meios de comunicação são referendos importantes para a confirmação dos discursos da comunicação corporativa e das estratégias de gestão das empresas. Os meios de comunicação de maneira hegemônica confirmam, reafirmam e consolidam os pontos de vista de colaboração e de dedicação integral do trabalhador à empresa. Reafirmam a empresa como universo simbólico fundamental para o sujeito, lugar em que ele deve disputar destaque, reconhecimento e status.
Tais resultados embasam nossa perspectiva atual de verificarmos como as mudanças no mundo do trabalho também alteraram as relações no âmbito da empresa de comunicação. Esse conjunto de mudanças deve estar incidindo no perfil do profissional de comunicação, afetando suas relações com a empresa e, principalmente, influenciando na maneira de produção e difusão dos produtos culturais. Fato que certamente traz novos desafios para a formação do comunicador, redimensionado o debate sobre qual é o papel da comunidade acadêmica nesse processo.
As corporações foram extrapolando o perfil de multinacionais para constituírem-se em grandes conglomerados que comportam empresas de diferentes razões sociais, atuando de forma diversificada em setores de produção, serviço e comércio diferenciados. Como redes, transcendem os territórios nacionais e continentais, mas mantém a centralização na matriz, produzindo, transmitindo e controlando a disseminação de tecnologia, a criação de novos produtos, a ampliação ou a redução de suas bases em determinados mercados. É recente e já bastante utilizado o termo fusão para caracterizar, além da aquisição de uma empresa por outra, a associação de empresas e de suas marcas.
Poderia-se afirmar que o conceito de empresa mudou profundamente nas últimas décadas. A concentração de renda e as constantes crises do sistema capitalista trouxeram um redesenho do cenário econômico, orientando o desenvolvimento e o uso das tecnologias no sentido da otimização do uso da mão-de-obra, reduzindo despesas, aumentando a produtividade e concentrando ainda mais as riquezas produzidas, e as tecnologias de informação são a alma esse processo.
Na atualidade, a reestruturação produtiva com a implantação do modelo toyotista, adequado a outras experiências bem sucedidas, se deu no bojo de novas tecnologias que beneficiaram o fluxo e a disseminação de conhecimentos, revolucionando o mundo do trabalho.
O resultado dessas ações, combinado, em alguns setores, à aquisição de novas tecnologias, foi a redução de postos de trabalho, o aumento da produtividade e da lucratividade, profunda desestruturação do mercado de trabalho, com a precarização da mão-de-obra, o desemprego estrutural e o aparecimento de novos perfis profissionais.
No caso específico das empresas de comunicação, a reestruturação produtiva começa no início dos anos 80, com a introdução dos computadores nas redações e torna-se fator decisivo na reorganização da produção, extinção de profissões, redesenho da organização produtiva nas redações de jornais, TVs e rádios.
Na sociedade capitalista globalizada, a comunicação avança do âmbito das relações genéricas do ser social em relação ao trabalho, para constituir-se em elemento do processo produtivo de riquezas e acúmulo de capital. Tal afirmação nos permite compreender o papel da comunicação na sociedade contemporânea e fazer a crítica ao postulado de J. Habermas, cuja teoria se contrapõe ao conceito de trabalho social, sobrelevando o conceito de comunicação.
Essa posição de Habermas se dá basicamente devido à gênese de sua compreensão sobre o papel da linguagem verbal no pensamento e na sociedade. Aspectos que o levarão a afirmar a ação comunicativa como atitude natural do homem na busca do consenso (também para ele comunicação), da negociação e da razão. Esta discussão teórica foi desenvolvida no capítulo inicial e final do Relatório dos resultados da pesquisa Comunicação e Trabalho. A construção dos sentidos do trabalho pelos receptores dos meios de comunicação (FÍGARO, 2001).
Referências citadas:
FÍGARO, Roseli. Comunicação e trabalho: as transformações do trabalho na empresa de comunicação. In: Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação, 28., 2005. Rio de Janeiro. Anais... São Paulo: Intecom, 2005. Disponível em: http://reposcom.portcom.intercom.org.br/bitstream/1904/17288/1/R1837-1.pdf Acesso em 30 ago. 2007.
FÍGARO, Roseli. Comunicação e Trabalho. Estudo de recepção: o mundo do trabalho como mediação da comunicação. São Paulo: Anita/Fapesp, 2001.
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